A PROSPERIDADE NO ANTIGO TESTAMENTO
Texto Áureo: Gn. 39.3 – Leitura Bíblica: Dt. 8.11-18
Pb. José Roberto A. Barbosa
Twitter: @subsidioEBD
INTRODUÇÃO
Interpretar
os textos bíblicos no contexto, inclusive o histórico-teológico, é
condição para a apropriada aplicação das verdades bíblicas. Os adeptos
da Teologia da Prosperidade (ou da Ganância) utilizam passagens
descontextualizadas (e isoladas) do Antigo Testamento para justificarem
suas doutrinas. Para evitar tais equívocos, estudaremos, na aula de
hoje, sobre como o Antigo Testamento aborda a questão da prosperidade,
destacando que, mesmo no Antigo Pacto, a posse de bens materiais
implicava em responsabilidade, em uma dimensão ética.
1. RIQUEZA E PROSPERIDADE NO ANTIGO TESTAMENTO
A
abordagem em relação à riqueza no Novo Testamento é distinta daquela
apresentada no Antigo Testamento. No Novo Testamento os textos que se
referem à riqueza são geralmente negativos, diferentemente daqueles da
Antiga Aliança. Isso porque no Antigo Testamento, no pacto de Deus com
Israel, a riqueza é algo desejável e agradável a Deus para o Seu povo.
Essa distinção não costuma ser percebida pelos pregoeiros da Teologia da
Prosperidade (ou da Ganância). Eles adoram propagar nos canais de
televisão que Deus abençoou Abraão e que, do mesmo modo, pretende
enriquecer aqueles que os seguirem. Mas é preciso atentar para o papel
da riqueza e da pobreza no Antigo Testamento, especialmente no que tange
a Abraão. Tanto esse servo de Deus quanto Jó podem ser categorizados
entre os ricos justos, isto é, eles não colocaram sua confiança na
riqueza, mas em Deus, por isso, no caso de Abraão, este deixou sua
parentela, a cidade de Ur onde morava e partiu em busca de uma terra que
o Senhor prometeu. Na medida em que Abraão sai, ele abre mão das suas
riquezas, demonstrando, assim, que não dependia da prosperidade
material, isso fica evidente na disputa entre os pastores de Ló,
sobrinho de Abraão, e os seus pastores. Em uma atitude de confiança em
Deus, Abraão deixa que Ló escolha o lado para o qual pretende ir. Uma
das provas bíblicas de que Abraão não se fiava na riqueza se encontra em
Gn. 14.21-24 onde está registrado o encontro deste com o rei de Sodoma.
Abraão não quis o enriquecimento que não viesse do Senhor, ele sabia
fazer a diferença entre a benção de Deus e a prosperidade dos homens. Jó
é outro exemplo de rico justo no Antigo Testamento, ele é reconhecido
pelo próprio Satanás que Deus o abençoou com bens materiais. O Inimigo
questiona se a causa do amor de Jó a Deus não está baseado nas riquezas.
Jó demonstra, em sua experiência provada, que ainda que morra não
deixará de confiar em Deus. Quando a riqueza e a prosperidade material
toma o primeiro lugar, o homem se distancia de Deus, isso pode ser
comprovado nas atitudes de Salomão. Este monarca, em sua riqueza e
prosperidade, se torna motivo de glória para o reino, mas ao contrário
de glorificar a Deus, se torna opressão para os filhos de Israel.
2. AS CONDIÇÕES PARA A RIQUEZA NO ANTIGO TESTAMENTO
De
acordo com a revelação do Antigo Testamento, é Deus o verdadeiro
proprietário das riquezas, por isso, Ele a entrega a quem deseja. É
neste sentido que Salomão admite que “na mão direita, a sabedoria lhe
garante a vida longa; na mão esquerda, riqueza e honra” (Pv. 3.16). Ana,
em sua oração, também reconhece que “O Senhor é quem dá pobreza e
riqueza; ele humilha e exalta” (I Sm. 2.7). Davi assim também expressa
em sua oração: “Ó Senhor nosso Deus, toda essa riqueza que ofertamos
para construir um templo em hora ao teu santo nome vem das tuas mãos, e
toda ela pertence a ti” (I Cr. 29.16). No Antigo Testamento, a riqueza
deva ser compreendida como benção de Deus, mas sua utilização tem uma
dimensão ética. Por isso Ezequiel questiona o príncipe de Tiro quando
esse se vangloria ao dizer “eu me enriqueci” (Ez. 29.3). Mesmo no Antigo
Testamento não é correto desejar as riquezas, considerando que o Senhor
destacou que Salomão foi distinto ao não pedir “uma vida longa nem
riquezas” (I Rs. 3.11). Não é certo requerer riqueza de Deus, por isso,
destaca o sábio: “Não me dês nem pobreza nem riqueza; dá-me apenas o
alimento necessário” (Pv. 30.8). E ainda “Não esgote suas forças tentado
ficar rico; tenha bom senso! As riquezas desaparecem assim que você as
contempla; elas criam asas e voam como águias para o céu” (Pv. 23.4,5), e
mais: “Quem tenta enriquecer-se depressa não ficará sem castigo” (Pv.
28.20). Paradoxalmente, as pessoas, atualmente, exaltam aqueles que
enriqueceram, ainda que os meios sejam escusos. O enriquecimento não
deve ser, desde a Antiga Aliança, um fim em si mesmo, ter dinheiro, por
sua vez, acarreta em responsabilidade. O orgulho proveniente das
riquezas pode conduzir as pessoas para distante de Deus, ao invés de
aproximá-las dEle. Os profetas denunciaram com coragem o amor às
riquezas: “Efraim orgulha-se e exclama: ‘Como fiquei rico e abastado! Em
todos os trabalhos que realizei não encontrarão em mim nenhum crime ou
pecado’” (Os. 12.8), sem dar a devida atenção para o “Mas” de Deus (Os.
12.9). Deus não se deixa impressionar com aqueles que adquirem riquezas
para si, e põem a confiança no dinheiro, principalmente quando tal
prosperidade vem por meios injustos. Em Pv. 13.11 está escrito que “O
dinheiro ganho com desonestidade diminuirá, mas quem o ajunta aos poucos
terá cada vez mais”. Sabemos que da perspectiva exegética, os
Provérbios não podem ser generalizados, mas fica evidenciada, no texto, a
insatisfação de Deus com a riqueza acumulada indevidamente. Apropriada a
palavra profética: “O homem que obtém riquezas por meios injustos é
como o perdiz que choca ovos que não pôs. Quando a metade da sua vida
tiver passado, elas o abandonarão, e, no final, ele se revelará tolo
(Jr. 17.11). Os teólogos da Teologia da Prosperidade (ou da Ganância)
não leem os escritos proféticos, apenas os históricos, se assim
fizessem, perceberiam que Deus condena Israel porque “vendem por prata o
justo, e por um par de sandálias o pobre” (Am. 2.6). Eles não poupam os
juízes e os sacerdotes, já que “seus líderes julgam sob suborno, seus
sacerdotes ensinam visando o lucro, e seus profetas adivinham em troca
de prata. E ainda se apoiam no Senhor” (Mq. 3.11). Quantos hoje dizem
servir a Deus, mas agem apenas com interesse no dinheiro, o $erviço
cristão, em alguns contextos eclesiásticos, é escrito com cifrão. O
dinheiro conduz a uma falsa segurança (Pv. 10.$5) e leva seus adoradores
a desejarem sempre mais (Ec. 5.10). Os que vivem regaladamente hoje,
usufruindo de recursos indevidos, receberão, no tempo devido, o
julgamento de Deus, pois “de nada vale a riqueza no dia da ira divina”
(Pv. 11.4).
3. RECOMPENSA E BENÇÃO NO ANTIGO TESTAMENTO
No
Antigo Testamento, a riqueza é uma recompensa pela fidelidade a Deus,
isso percebemos no caso de Josafá, quando o Senhor firmou o seu reino
por causa da obediência a Deus, mas, principalmente, pelo uso apropriado
dos pertences (II Cr. 17). A sociedade contemporânea, fundamentada em
um capitalismo selvagem, idolatrou o acúmulo de riquezas. Os heróis do
presente não são aqueles que agem com generosidade, mas os que retêm
tudo que podem exclusivamente para eles. Os bilionários se tornaram os
deuses do presente, o Mercado assumiu o trono no coração de muitos, a
bolsa de valores determina as ações das pessoas. Versículos isolados do
Antigo Testamento não podem ser utilizados irresponsavelmente para
justificar a opressão e a pobreza. Os adeptos da Teologia da
Prosperidade (ou da Ganância) gostam de citar Pv. 10.22, argumentando
que “A benção do Senhor traz riqueza”, mas esquecem que “A riqueza dos
sábios é a sua coroa” (Pv. 14.24) e que “A recompensa da humildade e do
temor do Senhor são a riqueza, a honra e a vida” (Pv. 22.4). Os livros
de sabedoria, dentre eles Salmos e Jó, explicitam a natureza da
prosperidade e põem a ênfase sobre o temor ao Senhor: “assim são os
ímpios, despreocupados, aumentam suas riquezas” (Sl. 73.12) e “não
confiem na extorsão, nem ponham a esperança em bens roubados; se as suas
riquezas aumentam, não ponham nelas o coração” (Sl.62.10). A riqueza e a
prosperidade é uma concessão de Deus, mas somente em sentido amplo,
pois os ricos podem ajuntar bens, apenas para confiar neles e se
distanciar do Senhor. Por isso, “os ímpios passam a vida na prosperidade
e descem à sepultura em paz. Contudo, dizem eles a Deus: ‘deixe-nos!
Não queremos conhecer os teus caminhos. Quem é o Todo-poderoso, para que
o sirvamos? Que vantagem temos em orar a Deus? (Jó. 21.7-15). O rico
tem uma propensão a confiar em suas riquezas, e a depender daquilo que
conseguiu acumular, vive como se Deus não existisse, e se acredita nEle,
não põe nEle sua confiança.
CONCLUSÃO
No
Antigo Testamento, a riqueza é uma dádiva de Deus, mas precisa ser
utilizada com cautela, pois implica em responsabilidade. A riqueza não
pode ser vista como uma propriedade pessoal, ela está na dimensão do
sagrado, na relação com o outro. Por isso, para Israel, sua plenitude
tem uma dimensão escatológica, tendo em vista que, no futuro, “se
alimentarão das riquezas das nações, e do que era o orgulho delas vocês
se orgulharão” (Is. 61.1). Mas isso não é para agora, se cumprirá por
ocasião do Milênio, nada tem a ver com a Igreja contemporânea, como
apregoa a Teologia da Prosperidade. Por enquanto, na fartura ou na
necessidade, devemos admitir, conforme foi revelado a Abraão, que o
Senhor, e somente Ele, é nossa Recompensa (Gn. 15.1).
BIBLIOGRAFIA
ELLUL, J. O homem e o dinheiro. Brasília: Palavra, 2008.
FOSTER, R. J. Dinheiro, sexo e poder. São Paulo: Mundo Cristão, 2005.